quinta-feira, 12 de julho de 2012

On/Off




Na internet a vida era frenética, tudo partia e retornava em uma velocidade estonteante, não havia problema que a solução não corresse o mundo e retornasse em questão de segundos, o mundo estava realmente em um estágio mágico e era exatamente neste universo que sentia-se o máximo! Um rei.



Conhecia milhares de pessoas ao redor do mundo, criaram uma língua de códigos e sinais que os faziam prosear horas e horas por entre seres de línguas as mais diversas, coisas jamais imagináveis, aliás coisas que fariam Vitor Hugo estremecer, seriam léguas e léguas pelo espaço.



O seu mundo era simples, um on ou off, ou um curtir ou não curtir, um ou dois clics, a comunicação em verbo único, rápido, rasteiro, dinâmico! Era disso que o cérebro humano sempre ansiava, pelo menos assim pensava em sua pouca vivência etária, mas sua universal relação. De uma coisa se orgulhava, seu avô, que havia sido Adido Cultural em vários países, não colecionava uma rede de amigos, que chegasse a um terço da que ele, em tão pouco tempo, construíra.



Seu mundo era perfeito e seguro, de tudo participava e nada o atingia, isso para os dias atuais de tanta violência e insegurança era tudo de bom. Sair só para ir à faculdade, com muita tensão, e retornar o mais rápido possível, não agüentava os limites da rua, se sentia em um aquário, limitado, tolhido, era pouco demais, precisava voltar ao seu quarto ao on-line e... Lá estava o mundo aos seus pés, ou melhor aos seus dedos.



- Aí... oooi... tem uma senhora ali, você não acha que deveria dar este lugar para ela sentar?

- ÃH... como? Desculpe. Você ta falando comigo?

- Claro, se toquei no seu ombro e falei diretamente olhando para você... Com quem mais estaria falando?



Nitidamente nauseado, abriu a janela e deixou o vento bater em seu rosto...



- Desculpe, você poderia repetir?

- Ôh... fecha esta janela aí, ta querendo me molhar todo?



Virou-se assustado, para ver a quem pertencia aquela voz, razoavelmente enfurecida, que “bafava” ao seu cangote. Amedrontou-se, sentiu-se ameaçado, começou a suar frio, era um contato áspero, temia por tudo, não sabia o que fazer, o que aquelas pessoas queriam e o que poderia fazer para sair daquela situação.



- Sim... E aí?! Você não está vendo que aquela senhora tem três vezes a sua idade? Não acha que deveria dar o lugar para ela descansar?

- Claro, claro, desculpe...

- Nossa! Não agüento mais ouvir você pedir desculpas...

- e aí, vai fechar essa janela ou não vai? (retornou a voz ao fundo, a esta altura já em pé sobre a sua cabeça).

- Só um estante (tentou fechar a janela), emperrou...

- Olha se você não vai levantar diga logo...



Criiii...crash...pah! Estrondou a janela ao lado do seu ouvido direito, olhou aquela mão enorme que ainda segurava a lingüeta da janela.



- Menino mole... Ta dormindo neném? Não tomou seu leitinho hoje não?



A gargalhada foi geral, de repente o ônibus inteiro parecia está sobre os seus ombros, em sua cabeça surgiam flashes que remetiam a trechos do filme do Pink Floyd...



Did you see the frightened ones?

Did you hear the falling bombs?

Did you ever wonder?

Why we had to run for shelter?*



O mundo girou. De repente a náusea, o insuportável. Aos seus olhos afiadas garras de harpias rondavam seu pescoço, olhos vermelhos o miravam, dentes tornavam-se pontiagudos; de sorrisos passavam a condição de ameaças, pensou em levantar, as pernas não obedeciam... A luz turvou, sobre a imensa montanha da sanidade os braços fecharam-se envoltos ao sol, o eclipse glaceou a Terra.



Acordou apavorado sem saber onde estava. Tudo era branco, havia sobre seu corpo um fino lençol branco que unia-se ás paredes brancas, o teto, a cortina, o piso, a porta, tudo era branco... Levantou o tronco assustado, a cabeça agitada, os cabelos em total desalinho:



- Onde estou? Que lugar é este? O que estou fazendo aqui? (tentou levantar), preciso ir embora...

- Calma, não tenha medo, está tudo bem...

- Mas como? O que estou fazendo aqui? Quem é você? Qual o seu link? Sua conexão? Não gosto de usar o Skype, prefiro digitar? A voz... esta voz... eu te conheço, conheço? Há quanto tempo somos amigos? Você disponibilizou foto?



Alguns passos e ela estava ao lado esquerdo de seu leito, era praticamente a única coisa não branca daquele ambiente, seu rosto fino e alvo, brilhava emoldurado pelos negros e longos cabelos que lhe caiam quase até a cintura, braços finos e muitos anéis prata compunham seus braços que saiam das finas alças do vestido estampado de milhares de desenhos de pequenas crianças empinando pipas, jogando peões, chutando bolas, brincando de roda... O vestido que se estendia até os joelhos, formavam um universo colorido e de uma alegria viva, tão viva que lhe despertou um largo sorriso quase unindo as pontas dos lábios à ponta dos olhos.



- Sim! Agora reconheci. Você é a voz que me falava algo no transporte... O que era mesmo?

- pedia-lhe para dar o acento para uma senhora, você sentiu-se mal, desmaiou e eu o trouxe ao hospital - (Tocou-lhe o braço), você está bem agora?



Ao sentir o toque, leve, suave e frio daqueles dedos finos, enfeitados de anéis e sentir o calor daquela voz, tão perto, em uma língua tão próxima e ao mesmo tempo tão esquecida, gelou! Sentiu-se despencando em um abismo sem fim... Quanto mais descia mais frio ficava, sentia como se seu sangue estivesse a ponto de congelar, não conseguia unir as palavras para formar uma frase, seu cérebro formava Estalactites que pingavam por seus olhos, correu o olhar sobre aquela menina de sapatilhas azul-turquesa e negros cabelos e finalmente conseguiu dizer uma pequena frase:



- Como você se chama?

- Amor.



Roger Ribeiro

12 de julho 2012.  



*Goodbye Blue Sky

Você já viu os apavorados?

Você já ouviu as bombas caindo?

Você já se perguntou

Por que tivemos que correr em busca de abrigo?










2 comentários:

  1. que meigo ... gostei : )

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  2. Nooossa! Demais, fessor!
    A historia foi como um tiro disparado para o nada q acerta no ponto mais vuneravel. Me pegou bem de surpresa. Incrivel! Surpreendente *-*

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