terça-feira, 16 de junho de 2009

Ontem será um belo dia!




Faz mais ou menos uma semana e meia que tumultuei minha cabeça, ou melhor, algo químico que emana de minhas emoções e que perturbam minha cabeça. Minhas idéias ficam confusas e sinto uma grande dificuldade de ater-me ao que dizem ser racional, natural e normal.

Por isso, hoje em especial acordei com a cabeça pesada, veja bem que falei cabeça e não consciência, aliás, acho que a única coisa leve em mim é a consciência.

Resolvi dar um basta nisso e, para tanto, ao descer do ônibus dirigir-me a uma das farmácias, que são abundantes por aqui, pensando melhor não só aqui onde me encontro no momento, na verdade elas são abundantes em toda a cidade. Percebi, já há algum tempo, que existem duas coisas abundantes nessa cidade: farmácia e bares. Creio que por ser uma realidade tão previsível, as pessoas necessitam dos bares como portais de novas percepções e atuações. Consequentemente, surge daí uma comunidade adoentada. Para ela; farmácias!

Entrei em uma que sei que não tem balança e nem vende produtos de estética. É, na verdade uma drogaria, como em tempos idos. Só vende remédios, drogas curativas, mesmo que a cura seja uma obsessão doentia. Dirigir-me com a firmeza de quem sabe a dose para a sua cura. Parei quase encostado no balcão de Jacarandá, frente a uma sisuda atendente (atendente de farmácia tem de ser sisuda, esse negócio de atendente de farmácia sorridente é um acinte, um despropósito. Por isso freqüento essa drogaria).

- Bom dia! Disse à senhora que me respondeu apenas com uma leve inclinação da cabeça, o silêncio é algo cultuado neste recinto, nada de conversinhas, risinhos, nada disso o ambiente é sério, circunspeto. Afinal, ali é uma farmácia, vendem-se drogas curativas.

O bar que vende a euforia barata é do outro lado da rua, bem em frente, o ambiente é diametralmente oposto. No bar a fala é cultuada e se você falar baixinho, sem dúvida, será mal visto, afinal o que quer você? O que está tramando? Quem pensas que é? No estabelecimento bar, todos participam de tudo, das poucas verdades e principalmente das muitas mentiras. O bar é o castelo, o templo máximo da mentira! Ali a bula é a sua verve de se vender.

De volta à drogaria, a balconista continuava a me olhar e esperar a minha solicitação. Como estávamos, minha boca de seu ouvido, a não mais do que um palmo, pude suavemente relatar-lhe a minha necessidade:

- Por favor a senhora tem xarope de sorriso? Sem dizer nada ela virou-se, pegou a enorme escada que corria em um trilho no topo da enorme estante, levou-a uns três passos à minha esquerda, subiu até a penúltima prateleira do armário, apanhou uma caixa e desceu lentamente já verificando o conteúdo da mesma.

- Senhor, desculpe, mas faz tempo que ninguém pede esse medicamento que acabamos por reduzir os pedidos, mas ainda tenho aqui, porém só em drágeas. O xarope, que é mais eficiente, acabou! Sinto muito.

O sinto muito final foi fundamental, em qual outra farmácia a atendente diz que sente muito por não ter todas as opções possíveis? Aliás, em que lugar alguém diz que sente muito por não ter o que se propõe a ter? Por isso freqüento essa drogaria.

Parei um tempo, peguei as drágeas, li as instruções, as possibilidades de efeitos colaterais, a forma de uso e, como era a única opção, comprei dois envelopes com quatro comprimidos cada. A compenetrada atendente ainda me sugeriu que fosse até outra farmácia que fica a uns cinqüenta metros, no máximo, de distância que ela guardaria aquelas drágeas para mim, caso não tivesse também lá o xarope.

Pensei: como vou em outra farmácia?! Lá, tenho certeza, serei atendido por uma balconista jovenzinha, toda sorridente, cheia de alegria, em plena farmácia, perguntando-me, quase aos gritos, se já fui atendido? Perguntará o que desejo, como se estivesse a um passo de me servir um sorvete de fruta, uma barra de chocolate ou algo assim. Coitada, não é culpa dela é que está mais acostumada a vender produtos de beleza, não creio que muita gente vá lá comprar drogas curativas. E quando lhe perguntar se tens sorriso em xarope? Ah! Aí é que o ambiente todo irá participar da minha enfermidade, isso se não vazar para a calçada e tornar-se comentário de todos que estiverem a transitar!

Definitivamente, não! Falei-lhe que levaria aqueles mesmos, afinal a fórmula era a mesma, o efeito também deveria ser semelhante.

Colocou o produto em um saco pardo de papel grosso, entregou-me junto à nota para que me dirigisse ao caixa. Não me agradeceu e nem se despediu. Não havia nada para ser agradecido nem tão pouco se desejar um até logo. Nossa! Seria um horror. Imagine uma atendente de loja de drogas curativas desejar revê-lo em breve! Não seria, no mínimo, nada gentil.

Paguei o produto a alguém que estava dentro da casinha do caixa e que era um ser oculto, ninguém nunca o viu. Entregou-me o troco e a nota. Em silêncio estava, em silencio ficou. Saí da loja curativa, a rua continuava “fervilhando”, todos correndo, parecendo que o trem da vida está sempre de partida e estamos sempre atrasados.

Retomei meu caminho natural do dia-dia e, passo a passo, fui encontrando os rostos que encontrava todo dia.

– Bom dia! Como vai? Bom dia! Bom dia! Cerca de 30 bons dias depois cheguei ao meu destino. Lembrei que me esqueci de, na drogaria, comprar uma dose de paciência. Por sinal era essa a verdadeira razão de ter ido à farmácia... Fazer o quê? Tomei duas drágeas das que havia comprado, soltei um largo sorriso e decidi: na hora do almoço vou a Seu Antônio engraxar minhas botas!

Roger Ribeiro.

16 de junho 2009.

5 comentários:

  1. A continuação do velho chato e da bota velha.. o que será que vem de novo ?

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  2. Com certeza essa estória foi escrita num bar.

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  3. rsrsrsrsrsrs ... é verdade Zitinho, papo de bebo da porra kkkkk

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  4. que inveja,
    poder delirar e expor o delirio de forma tão natural
    massa
    Têco

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  5. E por falar em BAR !!!!!

    Parece Que Bebe
    Itamar Assumpção


    Você parece que não sei
    Diz tanta coisa que vou te contar
    Olha pensando bem cala-te boca
    E tam e tal e coisa e lousa
    Sempre a mesma lenga-lenga
    A mesma transa o mesmo tchans
    E zás e trás tá louco fica só naquela
    E fica nessa sei lá maior comédia
    O que que é isso logo pra cima de moi
    Tô por aqui o sai fora disso
    Parece que bebe parece que sei lá.

    Abraços Meireles, Cássia e Maria!

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