sexta-feira, 3 de abril de 2009

Tens um analgésico aí?


“Penso logo existo”, vem de longe, de muito longe, essa afirmativa. Mas será mesmo assim? Será que basta pensar e pronto? Terás assim a certeza de que existes?

A vida, ou o que costumamos chamar de vida é assim, passamos por frases afirmativas, exclamativas, interrogativas, frases prontas, por fazer, por constituir-se. Frases soltas, curtas longas, ritmadas, melódicas. Frases falsas, verdadeiras, fingidas, forjadas, frases que não precisam ser ditas ou, que quando ditas tornam-se vazias, ocas, infundadas, infrutíferas. Será a vida realmente assim? Ou, como as frases, passamos por ela e não atentamos para seu significado, sua representação?

Pensar por que sopramos a vela a cada ano? Seria esse ato a representação de que nascemos? Ou na realidade o sentido é circularmente o oposto? Sim, você nem percebeu, mas já deve ter apagado a vela por quinze, vinte, trinta, quarenta e tantas vezes enquanto um seleto grupo lhe rogava por muitos anos mais de vida. Aí é que está o sentido do sopro, todo ano em uma data específica você prova que ainda está vivo, ou seja, se de você emanar ar, é porque estás vivo!

Parece coisa de quem não tem o que fazer, não é mesmo? Mas veja bem, o mundo tem o seu tempo e houve épocas em que a ciência era apenas uma interrogação, às vezes até uma má ação, sujeita a repreensões acaloradas, ardentes até. Portanto, para se certificar de que o ser desfalecido estava realmente apto ao sepultamento, colocava-se uma vela à frente da sua fronte, se a chama oscilasse era porque ainda havia naquele ser algum sopro de vida. A vida e suas representatividades. Será que vem daí a expressão: “a chama da vida”?

Muitos atribuem a tal da “chama da vida” à paixão. Por quê? Ora, porque fica mais fácil, afinal quem consegue definir paixão? Aliás, será a paixão apenas uma resposta que de tanto se repetir acabou tornando-se algo quase real?

Disse-me, um sábio amigo, certa feita, ser a paixão um estado de espírito, mas sempre achei esta explicação falha, veja você, quando estou eufórico, rindo à toa, dando bom dia a cobrador de ônibus, distribuindo simpáticos sorrisos ao meu redor é porque estou apaixonado? Ou “amarradinho”? Como disse um cabeludo ontem à porta de um show. Também quando estou triste, de olhos mareados, semblante fosco, sofrendo de vazio sem fim é porque estou apaixonado? “Amarradinho”? Platonicamente “ferrado”?

Bacana, não é? Mas me responda: e quando eu não estou nada? Onde fica a paixão? Por isso comecei a achar que paixão nada mais é do que uma resposta. Como não sei explicar, representar, demonstrar, então nomeio minhas insanidades de paixão. Sendo assim reflito: não posso ficar em um terreno tão fluido quanto à resposta - “paixão é um estado de espírito”. Ficaria louco se aceitasse isso, afinal, não me responderia nada e, pior, me acrescentaria um contêiner de dúvidas! Diga-me você, ser apaixonado, o que é espírito? Como essa coisa inexplicável, impalpável, inclassificável, irrepresentável, pode ter estado? Eu heim!?

Mas, por favor companheiro, sim você que está lendo essa pequena crônica, não se arvore em classificar-me tão rapidamente, não pense que hoje estou niilista demais, agnóstico em excesso, azedo, amargo. Não, nada disso! continuo concordando com o título de um livro de compilações de textos do poeta popular Caetano Veloso - ele é bom de títulos, muitas de suas músicas eu não gosto, mas gosto do título delas – o livro em questão chama-se “A Vida Não é Chata”, por sinal, recomendo sua leitura, possui uns textos bem legais, não são todos, mas é bem mais interessante do que o marrento “Verdades Tropicais”.

Porém, voltando ao que interessa, preciso parar com essa mania de desviar a rota da prosa, mas é que uma coisa vai puxando a outra, crônica é isso, creio que deve vir de Cronos, tempo, por isso é rápida ágil e fugaz. Uma crônica de hoje pode não ter o menor sentido amanhã, acho que é parecido com horóscopo de jornal, ele te diz que hoje o dia vai ser isso e aquilo, você se imbui disso e toca a existência, no outro dia se você lembrar do que falou sua tábua de astros, vai perceber que nada que foi dito se confirmou, a não ser o fato de que a chama continua a oscilar frente a seu rosto.

Lanço, portanto, a hipótese: tudo é representação. Você já reparou que ninguém consegue ver-te como você é? Acho que isso atormentava o filósofo Sartre. Ora, você não está me vendo? Na verdade você só vê o que quer. Não pense que essa hipótese veio do nada, eis a sua história: veio-me na cabeça a seguinte questão: o que é real? Respondi para mim mesmo: - é uma representação.

Mas, uma representação, necessita de representatividade, me disse essa voz que agente ouve dentro da nossa cabeça e não sabemos de onde vem. Respondi para essa voz com a voz da consciência: será?

Então me explique: cidade do Salvador, capital do Estado da Bahia, área 3.068,50 Km², população 2.844.241 habitantes, densidade demográfica 926,92 Hab/Km², deste montante temos 1.747.280 (um milhão setecentos e quarenta e sete mil duzentos e oitenta) eleitores, divididos em 4.263 seções eleitorais e o representante municipal eleito com maior representatividade teve 15.206 votos, o que lhe confere 0,0087026692916990980266471315415961 de representatividade frente ao Colégio Eleitoral da cidade, já o eleito com menor representatividade teve 5.402 votos o que lhe deposita 0,0030916624696671397829799699189598 do desejo dos cidadãos soteropolitanos.

O que me resta? Bem, resta-me apenas repensar a questão de ser a vida uma mera representatividade.

Roger Ribeiro.
17 de outubro de 2008.

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